sábado, 29 de setembro de 2012

A Morte - por Thomas Boston (1676-1732)



"Pois eu sei que me levarás à morte e à casa destinada a todo vivente." Jó 30:23.

Considere as várias comparações por meio das quais as Escrituras representam a brevidade da vida humana. Ouça Ezequias: “A minha habitação foi arrancada e removida para longe de mim, como a tenda de um pastor; tu, como tecelão, me cortarás a vida da urdidura” (Is 38:12). A tenda do pastor é removida rapidamente, pois os rebanhos não podem ser alimentados por muito tempo num só lugar; assim é a vida do homem nesta terra, some rapidamente. É uma teia que ele constantemente está tecendo; ele não fica ocioso um momento sequer: em pouco tempo ela é feita, e então é desfeita. Cada movimento de respiração é um fio dessa teia; quando se dá o último suspiro, conclui-se a teia. O homem expira, e então se desfaz, não respira mais. O homem é como erva, e como uma flor: “Toda a carne é erva”, até mesmo a mais forte e a mais saudável, “e toda a sua glória, como a flor da erva” (Is 40:6). A erva floresce pela manhã, mas quando cortada pelos ceifeiros, à noite está murcha. Assim também o homem, às vezes está andando para cá e para lá, tranquilo, pela manhã, e à noite já é um cadáver, derrubado por um golpe súbito de alguma das armas da morte. A flor é algo fraco e delicado, de curta duração, onde quer que cresça. Mas repare, o homem não é comparado à flor do jardim, mas à flor do campo, que pode ser pisada a qualquer tempo por algum animal. Assim também nossa vida está sujeita a centenas de acidentes todos os dias, e qualquer deles pode acabar conosco. Mas embora possamos escapar de todos eles, com o passar do tempo esse prazo murcha, essa flor desaparece por si mesma. Ela se desfaz “Tal como a nuvem se desfaz e passa” (Jó 7:9). Ela parece grande como uma nuvem da manhã, que promete grandes coisas, e desperta a expectativa do agricultor; mas o sol desponta, e a nuvem se dispersa; a morte chega, e o homem desaparece. O apóstolo Tiago pergunta: “Que é a vossa vida?” (Tg 4:14). Ouça a sua resposta: “Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa”. Ela é frágil, incerta, e não perdura. Ela é como fumaça, que sai da chaminé, como se fosse escurecer todo o céu; mas rapidamente se dispersa, e não se vê mais. Assim vai a vida do homem, e “quem é ele?” Ele é um sopro: “Lembra-te de que a minha vida é um sopro” (Jó 7:7). Ela é um golpe de vento passageiro, um curto bafejo: “vento que passa e já não volta” (Sl 78:39). Nosso fôlego está em nosso nariz, como se estivesse sempre batendo asas para partir; entrando e saindo, como um viajante, até que se vá, não retornando mais até que os céus deixem de existir.

por Thomas Boston (1676-1732) - A Morte 
- Excertos do livro: Os quatro Estados da Natureza Humana - p. 9-10 - Projeto Os Puritanos - (Título Original: "Human Nature in Its Fourfold State - p.218")

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Breve Biografia de Robert Murray McCheyne - (1813-1843)


Era inverno. Sentados próximo ao fogo, dois pedreiros estavam dedicados a sua tarefa. De repente, um desconhecido aproximou-se deles, desceu do cavalo e, imediatamente, passou a conversar sobre o estado espiritual da alma deles. Servindo-se das vivas chamas da fogueira como ilustração, o jovem desconhecido pregou verdades alarmantes. Com profunda surpresa, os pedreiros exclamaram: “Você não é um homem como os demais!” Ao que o desconhecido — que era Robert McCheyne — respondeu: “Eu sou, simplesmente, um homem como os demais”.

Parece que, tanto a leitura dos sermões de McCheyne quanto de sua biografia, fazem brotar do coração do leitor a mesma exclamação dos pedreiros: que, certamente, Robert McCheyne não foi um homem como os demais. Seu ministério, certamente muito breve, tornou-se uma das luzes mais brilhantes do evangelho na Escócia. Pureza doutrinária e fervor evangélico impregnaram por completo a pregação desse grande servo de Deus. Em McCheyne encontramos aquela característica tão sublime — e muito rara, infelizmente — de uma harmoniosa correspondência entre pregação e vida. A vida de McCheyne, que alguém definiu como “um dos mais belos exemplos da obra do Espírito Santo”, foi caracterizada por um alto grau de santidade e consagração.

Robert Murray McCheyne nasceu em Edimburgo em 29 de maio de 1813, numa época em que os primeiros resplendores de um grande ressurgimento espiritual tinham lugar na Escócia. Entre os preparativos secretos com que Deus contava para derramar sobre Seu povo dias de verdadeiro e profundo refrigério espiritual se achava o nascimento do mais jovem dos cinco filhos de Adam McCheyne.

Já desde a infância, Robert deu mostras de possuir uma natureza doce e afável, ao mesmo tempo em que todos podiam apreciar nele uma mente ágil e uma memória prodigiosa. Com a idade de quatro anos, enquanto se recuperava de uma enfermidade, Robert fez do estudo do hebraico e do grego seu passatempo favorito. Com oito anos, ingressou na escola superior para passar, anos mais tarde, para a Universidade de Edimburgo. Em ambos centros de ensino, distinguiu-se como estudante privilegiado, de forma especial nos exercícios poéticos. Ele é descrito como tendo boa estatura, cheio de agilidade e vigor, ambicioso, ao mesmo tempo em que era nobre em sua disposição, evitando qualquer forma de engano em sua conduta. Alguns consideravam que ele possuía, de forma inata, todas as virtudes do caráter cristão; mas, segundo seu próprio testemunho, aquela pura moralidade exterior por ele exibida nascia de um coração farisaico e, exatamente como muitos de seus companheiros, ele se empenhava para encher sua vida de prazeres mundanos.

A morte de seu irmão David causou uma profunda impressão em sua alma. Seu diário contém numerosas alusões a esse fato. Anos mais tarde, escrevendo a um amigo, Robert disse: “Ora por mim, para que eu possa ser mais santo e mais sábio, menos como eu mesmo sou e mais como meu Senhor é (…) Hoje fazem sete anos que perdi meu querido irmão, mas comecei a encontrar o Irmão que não pode morrer”.

A partir desse fato, sua terna consciência despertou para a realidade do pecado e das profundezas de sua corrupção. “Que infame massa de corrupção eu tenho sido! Vivi uma grande parte de minha vida completamente separado de Deus e para o mundo. Entreguei-me completamente ao gozo dos sentidos e às coisas que perecem ao meu redor”.

Ainda que ele nunca tenha sabido a data exata de seu novo nascimento, jamais abrigou qualquer temor de que isso não houvesse ocorrido. A segurança de sua salvação foi algo característico de seu ministério, de modo que sua grande preocupação foi, em todo tempo, obter uma maior santidade de vida.

No inverno de 1831, iniciou seus estudos na Divinity Hall, onde Thomas Chalmers era professor de Teologia, e David Welsh o era de História Eclesiástica. Com outros companheiros — Edward Irving, Horatius e Andrew Bonar (que, mais tarde, escreveu sua biografia) — e fervorosos amigos, Robert McCheyne se reunia para orar e estudar a Bíblia, especialmente nas línguas originais. Quando o Dr. Chalmers foi informado do modo simples e literal como McCheyne esquadrinhava as Sagradas Escrituras, não pode senão dizer: “Eu gosto dessa literalidade!” Verdadeiramente, todos os sermões deste grande servo de Deus são caracterizados por uma profunda fidelidade ao texto bíblico. Já neste período de sua vida, McCheyne dava mostra de um grande amor pelas almas perdidas e, junto com seus estudos, dedicava várias horas por semana à pregação do evangelho, tarefa que realizava quase sempre nos bairros pobres e mais baixos de Edimburgo.

Do mesmo modo que outros grandes servos de Deus, McCheyne tinha uma clara consciência da radical seriedade do pecado. A compreensão clara da condição pecadora do homem era para ele requisito imprescindível para fazer com que o coração sentisse a necessidade de Cristo como único Salvador e também era uma experiência necessária para uma vida de santidade. Seu diário dá testemunho de quão severo era no juízo que fazia de si mesmo. “Senhor, se nenhuma outra coisa pode livrar-me de meus pecados a não ser a dor e as provas, envia-nas, Senhor, para que eu possa ser livrado de meus membros carregados de carnalidade”. Mesmo nas mais gloriosas experiências do crente, McCheyne podia descobrir traços de pecado; por isso, disse em certa ocasião: “Até mesmo nossas lágrimas de arrependimento estão manchadas de pecado.”

Andrew Bonar escreveu sobre seu amigo nos seguintes termos: “Durante os primeiros anos de seus cursos no colégio, o estudo não chegou a absorver toda a sua atenção. Sem dúvida, tão logo começou a mudança em sua alma e isso também se refletiu em seus estudos. Um sentimento muito profundo de sua responsabilidade o levou a dedicar todos os seus talentos ao serviço do Mestre, que Quem os havia recebido. Poucos houve que, com tão completa dedicação, tenham-se consagrado à obra do Senhor como fruto de um claro conhecimento de sua responsabilidade”.

Enquanto fazia os cursos de Literatura e Filosofia, conseguia encontrar tempo para dedicar sua atenção à Teologia e à História Natural. Nos dias de sua maior prosperidade no ministério da pregação, quando, juntamente com sua alma, sua congregação e rebanho constituíam o centro de seus desvelos, com freqüência lamentava por não ter adquirido, nos anos anteriores, um caudal de conhecimento mais profundo, pois se havia dado conta de que podia usar as jóias do Egito para o serviço do Senhor. De vez em quando, seus estudos anteriores evocariam em sua mente alguma ilustração apropriada para a verdade divina e precisamente no solene instante em que apresentava o evangelho glorioso aos mais ignorantes e depravados.

Suas próprias palavras apresentam melhor sua estima pelo estudo e, ao mesmo tempo, revelam o espírito de oração que, segundo McCheyne, devia sempre acompanhá-lo: “Esforça-te em teus estudos”, escreveu a um jovem estudante em 1840. “Dá-te conta de que estás formando, em grande parte, o caráter de teu futuro ministério. Se adquirires agora hábitos de estudo marcados pelo descuido e a inatividade, nunca tirarás proveito do mesmo. Faz cada coisa a seu tempo. Sê diligente em todas as coisas; aquilo que valha a pena fazê-lo, faze-o com todas as forças. E, sobre todas as coisas, apresenta-te diante do Senhor com muita freqüência. Não tentes nunca ver um rosto humano enquanto não tiveres visto primeiro o rosto Daquele que é nossa luz e nosso tudo. Ora por teus semelhantes. Ora por teus professores e companheiros de estúdio.” A outro jovem escreveu: “Cuidado com a atmosfera dos autores clássicos, pois ela é, na verdade, perniciosa; e tu necessitas muitíssimo, para contestá-la, o vento sul que se respira das Escrituras. É certo que devemos conhecê-los — mas da mesma forma como o químico experimenta as substâncias tóxicas — para descobrir suas qualidades e não para envenenar com eles teu sangue.” E acrescentou: “Ora para que o Espírito Santo faça de ti não somente um jovem crente e santo, mas para que te dê também sabedoria em teus estudos. Às vezes, um raio da luz divina que penetra a alma pode dar suficiente luz para aclarar maravilhosamente um problema de matemática. O sorriso de Deus acalma o espírito e a destra de Jesus levanta a cabeça do descaído, enquanto Seu Santo Espírito aviva os efeitos, de modo que mesmo os estudos naturais vão um milhão de vezes melhor e mais facilmente.”

As férias para McCheyne, assim como para seus amigos íntimos que permaneciam na cidade, não eram consideradas como uma cessação do que se refere aos estudos. Uma vez por semana, costumavam passar uma manhã juntos com o fim de estudar algum ponto da teologia sistemática, assim como para trocar impressões sobre o que haviam lido em particular.

Um jovem assim, com faculdades intelectuais tão incomuns, às quais se unia ainda o amor ao estudo e uma memória extraordinariamente profunda, facilmente teria se destacado no plano da erudição se não houvesse posto em primeiro lugar, e como meta mais importante, a tarefa de salvar as almas. Todos os talentos que possuía ele os submeteu à obra de despertar àqueles que estavam mortos em delitos e pecados. Preparou sua alma para a terrível e solene responsabilidade de pregar a Palavra de Deus, e isso ele fazia com “muita oração e profundo estudo da Palavra de Deus, com disciplina pessoal, com grandes provas e dolorosas tentações, pela experiência da corrupção da morte em seu próprio coração e pela descoberta da plena graça do Salvador.” Por experiência, ele podia dizer: “Quem é que vence o mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus?” (1João 5.5).

No dia 1o. de julho de 1835, Robert Murray McCheyne obteve, do presbitério de Annan, licença para pregar. Depois de haver pregado por vários meses em diferentes lugares e ter dado evidência da particular doçura com que a Palavra de Deus fluía de seus lábios, McCheyne tornou-se o ajudante do pastor John Bonar nas congregações unidas de Larbert e Dunipace, nas cercanias de Stirling. Em sua pregação, fazia com que os outros participassem de sua vida interior, como de sua alma, à medida que crescia na graça e no conhecimento do Senhor e Salvador. Começava o dia muito cedo cantando salmos ao Senhor. A isso se seguia a leitura da Palavra para a própria santificação. Nas cartas de Samuel Rutherford [a serem publicadas por esta editora] encontrou uma mina de riquezas espirituais. Entre outros livros que apreciava ler estavam: Chamamento aos Inconversos, de Richard Baxter, e A Vida de David Brainerd, de Jonathan Edwards.

Em novembro de 1836, foi ordenado pastor na igreja de São Pedro, em Dundee. Permaneceu como pastor dessa congregação até o dia de sua morte. A cidade de Dundee, como ele mesmo deixou escrito, “era uma cidade dada à idolatria e de coração duro”. Mas não havia nada em suas mensagens que buscasse o agrado do homem natural, pois não estava em seu coração buscar o beneplácito dos inconversos. “Se o evangelho agradasse ao homem carnal, então, deixaria de ser evangelho”. Estava profundamente persuadido de que a primeira obra do Espírito Santo na salvação do pecador era a de produzir convicção de pecado e de trazer o homem a um estado de desespero diante de Deus. “A menos que o homem seja posto no nível de sua miséria e culpa, toda a nossa pregação será vã. Somente um coração contrito pode receber a um Cristo crucificado”. Sua pregação era caracterizada por um elemento de declarada urgência e alerta. “Que Deus me ajude sempre a falar-vos com clareza. Mesmo a vida daqueles que vivem mais anos é, na verdade, curta. No entanto, essa vida curta que Deus nos deu é suficiente para que busquemos o arrependimento e a conversão, pois logo, muito logo, passará. Cada dia que passa é como um passo a mais em direção ao trono do juízo eterno. Nenhum de vós permanece imutável; talvez estejais dormindo; não importa, pois a maré do tempo que passa vos está levando mais para perto da morte, do juízo e da eternidade”.

Ao seu profundo amor pela almas se somava uma profunda sede de santidade de vida. Escrevendo a um companheiro no ministério, disse: “Acima de todas as coisas, cultiva teu próprio espírito. Tua própria alma deveria ser o principal motivo de todos os teus cuidados e desvelos. Mais que os grande talentos, Deus abençoa àqueles que refletem a semelhança de Jesus em sua vida. Um ministro santo é uma arma terrível nas mãos de Deus”. McCheyne talvez pregasse com mais poder com sua vida do que com suas mensagens, e ele sabia bem, como nos disse seu amigo Andrew Bonar, que “os ministros do Evangelho não só devem pregar fielmente, mas também viver fielmente”.

Como pastor em Dundee, McCheyne introduziu importantes inovações na congregação. Naquela época, as reuniões de oração, se não eram desconhecidas, eram muito raras. McCheyne ensinou aos membros a necessidade de congregar-se cada quinta-feira à noite a fim de unirem o coração em oração ao Senhor e estudar Sua Palavra. Também destinava outro dia durante a semana para os jovens. Seu ministério entre as crianças constitui a nota mais brilhante de seu ministério.

Ao seu zelo por santidade de vida uniu-se seu afã por pureza de testemunho entre os membros de sua congregação. McCheyne era consciente de que a igreja — como parte do Corpo místico de Cristo — devia manifestar a pureza e santidade Daquele que havia morrido para oferecer uma Igreja santa e sem mancha ao Pai. Por isso, seu zelo pela observância de disciplina na congregação: “Ao começar meu ministério entre vós, eu era em extremo ignorante da grande importância que na Igreja de Cristo tem a disciplina eclesiástica. Pensava que meu único e grande objetivo nesta congregação era o de orar e pregar. Vossa alma me parecia tão preciosa e o tempo se me apresentava tão curto que eu decidi dedicar-me exclusivamente com todas as minhas forças e com todo o meu tempo ao labor de evangelização e doutrina. Sempre que, diante de mim e dos presbíteros desta igreja, se nos apresentaram casos de disciplina, eu os considerava como dignos de aborrecimento. Constituíam uma obrigação diante da qual eu me encolhia. Mas agradou ao Senhor, que ensina a Seus servos de maneira muito diferente daquela usada pelos homens, abençoar — inclusive com a conversão — alguns dos casos de disciplina a nosso cuidado. Desde então uma nova luz se acendeu em minha mente: dei-me conta de que não somente a pregação era uma ordenança de Cristo, mas também o exercício da disciplina eclesiástica.”

Enquanto o vigor e a força espiritual de sua alma alcançavam uma grandeza gigantesca, a saúde física de McCheyne se via minada e debilitada conforme transcorriam os dias. Ao final de 1838, uma violenta palpitação do coração, ocasionada por seus árduos labores ministeriais, obrigaram o jovem pastor a retirar-se para um descanso. E como sua convalescença se processava em ritmo muito lento, um grupo de pastores, reunido em Edimburgo na primavera de 1839, decidiu convidar McCheyne a se unir a uma comissão de pastores que planejava ir a Palestina para estudar as possibilidades missionárias da Terra Santa. Todos criam que tanto o clima como a viagem redundariam em benefício para a saúde do pastor. Do ponto de vista espiritual, sua passagem pela Palestina se constituiu uma verdadeira bênção para a sua alma. Visitar os lugares que haviam sido cenário da vida e obra do bendito Mestre e pisar a mesma terra que um dia pisara o Varão de dores foi uma experiência indescritível para o jovem pastor. No entanto, fisicamente, o estado de McCheyne não melhorou; antes, pelo contrário, parecia que seu tabernáculo terrestre ameaça sofrer um desmoronamento total. E, assim, nos últimos dias de julho de 1839, encontrando-se a delegação missionária próxima de Esmirna, e já para regressar, McCheyne caiu gravemente enfermo. Quando tudo fazia pensar em uma rápida morte, o Senhor estendeu Sua mão curadora e o grande servo do evangelho pôde, por fim, regressar a sua amada Escócia e ao seu querido rebanho em Dundee.

Durante sua ausência, o Espírito Santo começou a operar um maravilhoso avivamento na Escócia. Este avivamento começou em Kilsyth sob a pregação do jovem pastor W. C. Burns, que havia substituído McCheyne enquanto durava sua convalescença. Num curto espaço de tempo, a força do Espírito Santo, que impulsionava o avivamento, se deixou sentir em muitos lugares. Em Dundee, onde os cultos se prolongavam até tarde da noite todos os dias da semana, as conversões foram muito numerosas. Era como se toda a cidade houvesse sido sacudida pelo poder do Espírito.

Em novembro do mesmo ano, McCheyne, recuperado de sua enfermidade, regressou a sua congregação. Os membros da igreja de São Pedro transbordaram de alegria ao ver de novo o rosto amado de seu pastor. A igreja estava absolutamente lotada e, enquanto todos esperavam que McCheyne ocupasse o púlpito, um silêncio absoluto reinada entre os que estavam ali congregados. Muitos membros derramaram lágrimas de gratidão ao rever o rosto de seu pastor. Mas, ao finalizar o culto e movidos pelo poder de sua pregação, muitos foram os pecadores que derramaram lágrimas de arrependimento.

O regresso de McCheyne a Dundee marcou um novo episódio em seu ministério e também na igreja escocesa. Era como se a partir daquele momento, o Senhor se houvesse disposto a responder às orações que o jovem pastor elevara no princípio de seu ministério, suplicando por um avivamento. Ali, onde McCheyne pregara, o Espírito acrescentava novas almas à Igreja.

Na primavera de 1843, quando McCheyne regressara de uma série de reuniões especiais em Aberdeenshire, caiu repentinamente enfermo. Lá ele havia visitado a vários enfermos de febre infecciosa, e a constituição enfermiça e débil de McCheyne sucumbiu ao contágio da mesma. No dia 25 de março de 1843 partiu para estar com o Senhor.

“Em todas as partes onde chegava a notícia de sua morte”, escreveu Bonar, “o semblante dos crentes se enchia de tristeza. Talvez não tenha havido outra morte que impressionasse tanto aos santos de Deus na Escócia como a deste grande servo de Deus que consagrou toda a sua vida à pregação do evangelho eterno. Com freqüência, ele costumava dizer: ‘Vivei de modo que, um dia, sintam de vós saudades’, e ninguém que houvesse visto as lágrimas que se verteram por ocasião de sua morte teria dúvidas em afirmar que sua vida havia sido o que ele havia recomendado a outros. Não tinha mais do que 29 anos quando o Senhor o levou.

“No dia do enterro, foram suspensas todas as atividades em Dundee. Do lugar do velório até o cemitério, todas as ruas e janelas estavam abarrotadas de uma grande multidão. Muitas almas se deram conta naquele dia de que um príncipe de Israel havia caído, enquanto muitos corações indiferentes experimentaram uma terrível angústia ao contemplar o solene espetáculo.

“O túmulo de Robert McCheyne ainda pode ser visto na parte nordeste do cemitério que circunda a igreja de São Pedro. Ele se foi para as montanhas de mirra e para as colinas de incenso, até que desponte o dia e fujam as sombras. Terminou sua obra. Seu Pai celestial não tinha para ele nenhuma outra planta para regar nem outra vide para cuidar, e o Salvador, que tanto o amou em vida, agora o esperava com Suas palavras de boas-vindas: ‘Bem está, servo bom e fiel. (…) Entra no gozo do teu senhor’ (Mateus 25.21)”.

O ministério de Robert McCheyne não terminou com sua morte. Suas mensagens e cartas, com sua biografia escrita por seu amigo Andrew Bonar, são ricos instrumentos de bênção para muitas almas.

- Traduzido por Francisco Nunes de Mensajes Bíblicos, de Robert Murray McCheyne, publicado por The Banner of Truth Trust. (c) 1961 The Banner of Truth Trust, para Editora dos Clássicos

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Carta para a Ritalavasaia - Uma Mulher que Crê Falar em Línguas


*A presente carta é de gênero fictício, embora contenha situações da vida real.

Olá, Ritalavasaia. 

Permita-me iniciar dizendo que a primeira vez que ouvi seu nome, o achei um tanto quanto diferente. Lembro-me de ouvir você explicando o motivo dele: certa vez sua mãe estava falando em "línguas" (ou julgava assim fazer) e "profetizou" que a primeira palavra que saísse de sua boca, seria o nome da próxima filha que o Senhor daria. Confesso: uma história um tanto quanto interessante.

Bem, na verdade, não estou escrevendo esta carta para falar sobre seu nome, mas sim acerca de algo que você realiza: o chamado falar em "línguas". Ainda é recente em minha memória aquele dia em que você me encontrou no terminal de ônibus urbano e, logo em seguida, você se deparou com outra mulher que começou a profetizar e falar em línguas estranhas sobre você - se me recordo corretamente, era sobre alguma viajem, bênçãos e outras coisas mais de sua vida. Lembro-me também que aquela mulher ficou um tempo considerável repetindo exatamente as mesmas palavras, mas toda vez tinha um significado diferente - segundo o que ela mesma "interpretava".

Todavia, acontece que esta prática de falar em "línguas", não é bíblica. Sim, eu sei que você pensa que é e que em sua igreja muitas pessoas alegam ter este "dom" de Deus. Mas, deixe-me esclarecer algumas coisas:

Talvez tenham lhe ensinado que o "batismo com o Espírito Santo" seja uma segunda bênção que o crente recebe, de modo que quando ocorre, ele fica verdadeiramente capacitado para a obra do Reino - o sinal desta bênção, então, seria o falar em "línguas" estranhas/angelicais. Porém, preciso ser sincero com você e dizer que isso não é verdade. O que a Bíblia retrata no livro de Atos dos Apóstolos, não é uma segunda bênção, e sim o cumprimento de uma promessa de Jesus, que havia dito que após Sua ascensão aos céus, não deixaria os Seus discípulos sozinhos, mas enviaria o Consolador, a saber, o Espírito Santo (Jo 16.7). Assim sendo, quando ouve o derramamento do Espírito Santo registrado no capítulo 2 de Atos, se fazia concreta a promessa de Cristo. Note, porém, que as línguas lá faladas, não eram "línguas estranhas", mas sim humanas: "E em Jerusalém estavam habitando judeus, homens religiosos, de todas as nações que estão debaixo do céu... Como, pois, os ouvimos, cada um, na nossa própria língua em que somos nascidos? Partos e medos, elamitas e os que habitam na Mesopotâmia, Judéia, Capadócia, Ponto e Ásia, E Frígia e Panfília, Egito e partes da Líbia, junto a Cirene, e forasteiros romanos, tanto judeus como prosélitos, Cretenses e árabes, todos nós temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus" (Atos 2.5, 8-11 - grifo meu).

Poder ser que você ainda continue persuadida de que o que digo não seja verdade, pois você entende que após o evento que se deu na festa do Pentecostes (observe é que a festa se chamava Pentecostes, e não a bênção - portanto, o termo "cristão pentecostal", é um tanto quanto equivocado), outros discípulos receberem o Espírito Santo pela imposição de mãos (At 9.17; 19.6). Ocorre que este fato é facilmente respondido pela ordem cronológica dos acontecimentos. Em outras palavras, uma vez que o Espírito Santo ainda não havia sido derramado em Sua plenitude, mas alguns já haviam sido batizados antes d'Ele ser enviado a todos os crentes, estes (os batizados antes da vinda) precisavam recebê-lO. Aqui se encontra o motivo porque alguns receberam o chamado "batismo do Espírito Santo" após o batismo das águas: porque na época do seu batismo, ainda o Espírito Santo não havia sido enviado para todos os cristãos. Por consequência lógica, os que iam sendo convertidos e batizados após a vinda do Espírito, no próprio batismo já recebiam-O, não havendo o porquê de esperarem uma segunda bênção,

Sei, irmã Ritalavasaia, que naquela vez que estávamos conversando sobre este assunto, você citou a questão de Paulo dizer: "Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine" (1Co 13.1), e também: "O que fala em língua desconhecida edifica-se a si mesmo, mas o que profetiza edifica a igreja" (1Co 14.4). Deixe-me, então, tecer breves comentários sobre estas duas passagens.

Realmente não sei como andam seus estudos teológicos e quanto tempo você tem dedicado semanalmente ao estudo sério das Escrituras (também não sei se seu marido tem feito o "dever de casa" e lhe auxiliado na compreensão da Palavra do Altíssimo). De qualquer maneira, e me perdoe a sinceridade "brusca", mas apelar para estes dois versículos, como que buscando neles um aval positivo para esta prática de "falar em línguas", é ser mal entendedor e estudioso da Bíblia.

Quando Paulo fala em línguas "dos anjos", talvez você não saiba ou omitiram a verdade em sua igreja, mas o apóstolo está se utilizando de uma hipérbole - um recurso literário que fala um absurdo, a fim de esclarecer e dar maior ênfase ao assunto. É como se ele dissesse: "ainda que eu subisse o monte Everest 10 vezes num só dia, se não tivesse amor...". Sob hipótese alguma, Paulo poderia falar literalmente a língua dos anjos, pois de imediato surgiriam três problemas: 1. de quais anjos ele estava falando - dos santos ou dos caídos? 2. Como um homem pecador poderia ter em seus lábios o santo palavreado dos anjos que nunca pecam, isto é, como uma linguagem absolutamente pura iria conviver com um coração inclinado para o mal, ainda que regenerado? 3. Aliás, se tal coisa fosse possível e supostamente alguém pudesse falar em tal idioma, como é que há tantas divergências de interpretações sobre a mesma "frase" que alguém profere? Caso ainda esteja convicta desta ideia, sugiro que grave você mesma falando em línguas e, depois, enviarei esta cópia para diferentes pessoas que dizem ter o "dom de interpretação" - se for de Deus, tenho certeza que todas as interpretações serão cem por cento idênticas, pois o próprio Paulo afirma no capítulo seguinte: "Porque Deus não é Deus de confusão, senão de paz, como em todas as igrejas dos santos" (1Co 14.33).

Com relação a quem fala em "línguas" e "edifica-se a si mesmo", se percebe outro absurdo pregado em muitos púlpitos. Basta se dedicar algum tempo a esta passagem e se irá perceber que edificar a si mesmo, na linguagem e contexto de Paulo, não faz qualquer sentido, exceto se compreendido como sendo, também, uma hipérbole ou ironia. Se tal fato fizesse sentido, bastaria que quem fala em línguas, se trancasse em seu quarto e durante horas a fio falasse diretamente com o Senhor - ao sair do aposento, penso que seu rosto brilharia como o de Moisés que falou com Deus (Êx 34.30). Destarte, o que Paulo está dizendo é em sentido irônico, pois veja que ele está falando que todo dom é dado para a edificação da igreja de Deus: "Assim também vós, como desejais dons espirituais, procurai abundar neles, para edificação da igreja" (1Co 14.12). Logo, não poderia afirmar o oposto, isto é, que alguém poderia ter um dom que tão somente edificasse a si próprio.

Portanto, irmã Ritalavasaia, ore ao Senhor para que Ele lhe conceda entendimento e, por fim, cesse com esta prática. Não dê ouvidos àquelas mulheres amigas suas e a alguns homens amigos seus e de seu marido, que dizem que você precisa falar em "línguas", afinal, como lemos abundantemente nas Escrituras, o que o Senhor deseja não são atos externos, mas sim internos; não sacrifícios ritualísticos, mas conhecimento e misericórdia (Os 6.6); não o rasgar das vestes, mas sim o do coração (Joel 2.13); não a limpeza de objetos, mas a do homem interior (Mt 23.25) - todas as estas coisas, mostrando e ensinando-nos que o verdadeiro cristão não é o que fala em "línguas" e fica num balbuciar sem sentido diante da igreja, mas sim aquele que se dedica a compreender e praticar o ensino genuíno e puro de Deus.

Recomendo que da próxima vez que se sentir "tentada" a falar em "línguas", lembre-se de que isso não agrada ao Senhor, nunca foi uma prática da igreja histórica (procure ler e estudar sobre a história da Igreja) e não é possível ser defendido biblicamente.

Que o Senhor seja contigo e te liberte do misticismo em que estás inserida.

Em Cristo e para a progressão de Seu reino,
Filipe Luiz C. Machado.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Efésios 2.6 - Nos Ressuscitou Juntamente com Ele - Exposição em Efésios - Sermão pregado dia 23.09.2012



Efésios 2.6 - Nos Ressuscitou Juntamente com Ele
Exposição em Efésios -
Sermão pregado dia 23.09.2012

"E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus" (Ef 2.6).

As Escrituras nos são evidentes ao declarar anteriormente que, o homem natural, nada pode fazer para herdar a salvação por si mesmo. O apóstolo tratou dessa questão ao afirmar dois pressupostos básicos, a saber, que os crentes eram vivificados "juntamente com Cristo" e que isso era devido à graça de Deus, pois "pela graça sois salvos". Estes pontos são de suma importância para a sequência desta presente carta de Paulo, afinal, uma vez que os crentes de Éfeso foram informados de que suas vidas estavam em Cristo e n'Ele habitava toda misericórdia (Ef 2.4), então, mister se fazia com que lhes fosse ampliado a questão da salvação em Cristo. Noutras palavras, o apóstolo, agora, escreve aos efésios no intuito de lhes mostrar que uma vez estando firmemente arraigados em Jesus, podem confiadamente crer que ressuscitarão "juntamente com ele".

A doutrina da ressurreição, talvez dentre todos os ensinamentos que o cristão deve saber, seja uma das mais salutares e necessárias para a esperança nesta terra. Aqui, dizemos esperança, porque, embora os verdadeiros crentes possam descansar sob a certeza da salvação, ainda que labutem diariamente em busca de maior santificação e anseiem realizar tudo para a glória de Deus (1Co 10.31), de nada adiantaria o pregar sobre a salvação, se não houvesse esperança de ressurreição. Sobre este ponto, o próprio apóstolo Paulo tratou mais detidamente com os irmãos de Corinto, cuja igreja se encontrava em grande confusão doutrinária e alguns dentre eles estavam sendo levados por pensamentos deste mundo.

Analisemos, portanto, sob a bênção do Espírito Santo, o que a Bíblia Sagrada nos fala sobre a importância da ressurreição.

"E nos ressuscitou juntamente com ele". Ressuscitar não é um ato de bravura ou algum feito digno de ovações públicas. Sim, o morto que vem à vida por meio do Espírito, não tem do que se gloriar, pois "Aquele que se gloria glorie-se no Senhor" (1Co 1.31; 2Co 10.17). A glória, o esplendor e a beleza da ressurreição, recaem sempre sobre o autor do feito, aquele cujo poder venceu a morte e triunfou sobre ela.

De modo específico, é disto que Paulo tratou com os irmãos de Corinto, mais particularmente em sua primeira carta, no capítulo quinze. A igreja de Corinto padecia de uma série de enfermidades que precisavam ser tratadas pelo Senhor, através do apóstolo enviado. Especialmente neste capítulo, Paulo lhes ensina e corrige alguns entendimentos errôneos que aqueles homens estavam tendo. Observemos que nos é registrado que Paulo aventa a possibilidade de alguns daqueles homens e mulheres de Corinto estarem crendo em vão (v.2), pois de acordo com o que trata no restante do capítulo, alguns imaginavam que não havia ressurreição do corpo, mas sim apenas do espírito. Para o apóstolo, crer numa ressurreição "parcial" era o mesmo que negar a fé.

A fim de demonstrar aos irmãos que a ressurreição corporal de Cristo foi real, ele cita que Jesus, não somente morreu e ressuscitou, mas também "que foi visto por Cefas, e depois pelos doze. Depois foi visto, uma vez, por mais de quinhentos irmãos, dos quais vive ainda a maior parte, mas alguns já dormem também. Depois foi visto por Tiago, depois por todos os apóstolos. E por derradeiro de todos me apareceu também a mim, como a um abortivo" (1Co 15.5-8). Os crentes de Corinto tinham sérias dificuldades para compreenderem a ressurreição corporal de Cristo e dos filhos de Deus, pois à semelhança do gnosticismo que prega ser o corpo mau e a alma boa, não podendo assim, o corpo ressuscitar, também muitos estavam enveredando por este caminho, crendo que somente o espírito dos crentes é que ressuscitaria no último dia e o corpo seria deixado nesta terra.

Respondendo a este pensamento, Paulo diz: "Ora, se se prega que Cristo ressuscitou dentre os mortos, como dizem alguns dentre vós que não há ressurreição de mortos? E, se não há ressurreição de mortos, também Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé" (1Co 15.12-14 - grifo meu). O que apóstolo lhes explica é que, o fato de pregar sobre a ressurreição dos mortos, significa, por si só, que tal fato é verdadeiro! Anteriormente, Paulo havia escrito àqueles irmãos: "Sede meus imitadores, como também eu de Cristo. E louvo-vos, irmãos, porque em tudo vos lembrais de mim, e retendes os preceitos como vo-los entreguei" (1Co 11.1-2). Isto é, se apóstolo estava os ensinando sobre a ressurreição também do corpo e este (e outros) ensinamento ele havia recebido do Senhor (até porque ele havia visto a Cristo, conforme versículo 8), "como dizem alguns dentre vós que não há ressurreição de mortos?" É como se o apóstolo estivesse perguntando: "Coríntios, se prego a vocês o que recebi do Senhor, como pois não credes na ressurreição dos mortos?" Ele mesmo enfatiza este ponto, dizendo: "E, se não há ressurreição de mortos, também Cristo não ressuscitou". Ora, se Cristo não ressuscitou, então Paulo estava sendo mentiroso ao afirmar que Jesus lhe apareceu. Por fim, completa dizendo: "E, se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé". Em suma, Paulo afirma aos irmãos de Corinto que, "se Cristo não ressuscitou", a pregação não tem qualquer motivo de existência e também a suposta fé que eles tinham, "é vã". Ademais, se assim fosse, melhor seria se entregar à devassidão e aos prazeres da vida: "Se, como homem, combati em Éfeso contra as bestas, que me aproveita isso, se os mortos não ressuscitam? Comamos e bebamos, que amanhã morreremos" (1Co 15.32).

Posteriormente, no intuito de confirmar aos crentes de que a ressurreição lhes era importante, Paulo diz: "Porque assim como a morte veio por um homem, também a ressurreição dos mortos veio por um homem" (1Co 15.21). Por um homem (Adão) veio a morte, mas por outro (Cristo), a vida; pelo primeiro, a destruição - pelo segundo, a salvação; pelo primeiro, a corrupção - pelo segundo, a incorrupção; pelo primeiro, a fraca perseverança - pelo segundo, a eterna bem-aventurança; pelo primeiro, orgulho - pelo segundo, humildade; pelo primeiro, altivez de espírito e desejo incontrolável - pelo segundo, mansidão e espírito de servidão.

Destarte, então, é que quando Paulo diz aos crentes de Éfeso que "E nos ressuscitou juntamente com ele", o apóstolo não lhes está falando de coisa pequena ou com pouca aplicação, pois uma vez que Cristo ressuscitou verdadeiramente, todos os cristãos podem confiadamente se assegurar de que também ressuscitarão "juntamente com ele". Notemos três pontos de grandiosa importância:

Em primeiro lugar, a ressurreição dos cristãos não é um ato voluntário de cada crente. Tal qual Lázaro, já cheirando mal, foi retirado do túmulo (Jo 11.39), também nós, se não estivermos verdadeiramente em Cristo, seremos tragados pela morte e nossa ressurreição não será  "juntamente com ele", mas contra Ele - e isso resultará no sofrimento eterno. Em segundo lugar, ressurreição implica em vitória sobre a morte. "E, quando isto que é corruptível se revestir da incorruptibilidade, e isto que é mortal se revestir da imortalidade, então cumprir-se-á a palavra que está escrita: Tragada foi a morte na vitória" (1Co 15.54). O fato de a ressurreição ser juntamente com Cristo e ser prometida aos cristãos, lhes revela a grandiosa obra que o Senhor realizou na vida de todos os Seus filhos: pela obra do Filho, retirou a sua corrupção e lhes deu incorrupção; lhes tirou a mortalidade e os vestiu de imortalidade; retirou-lhes o poder da morte e os fez triunfar sobre ela. Em terceiro lugar, não é oferecida nenhuma saída, exceto Cristo. Muitos têm dito que o cristianismo é um sistema de doutrina fechada, que não possui espaço para qualquer outra divindade e que não abarca o princípio da universalidade do amor que é (supostamente) mais importante que o entendimento correto - e eles estão certos. O cristianismo é completamente fechado: ou se está em Cristo, ou se está perdido. Não há como escapar da ira vindoura (Mt 3.7; Lc 3.7), "E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos" (At 4.12).

Neste sentido, portanto, podemos crer que muito do esfriamento dos crentes (aqui, falo de esfriamento em sentido estrito, isto é, não o total, mas sim o parcial, cuja porção perdida é integralizada na vida do cristão, na medida em que vai sendo cheio do Espírito e por Este é ensinado, admoestado e santificado) é devido ao fato de não darem o devido valor e/ou sequer se dedicarem a algum estudo profundo das Escrituras, de modo que possam compreender o mistério da ressurreição. Replicando as palavras já citadas, "E, se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé" (1Co 15.14). O erro de muitas pessoas têm consistido em não valorizar o porvir, não ter uma mentalidade peregrina (Hb 13.14) e não se esmerarem em lembrar diariamente que a verdadeira plenitude da bênção está nos céus (Ef 1.3). Ora, se tal grande porção se encontra nos lugares celestiais, como pode ser possível que muitos não se esforcem para entenderem tão imperiosa doutrina?

Tristemente paira em nossos arraiais evangélicos uma grande e espessa névoa branca de dúvidas e incertezas, fazendo com que muitos não consigam enxergar o sol que brilha acima de suas cabeças. Assim como uma criança, no dia nublado, pensa que o sol não "saiu" naquele dia, igualmente muitos vivem como se o cristianismo fosse iluminado por algo estranho, alheio a Deus. Isto é, temos visto muitas pregações e ouvido muitas conversas de pessoas que falam sempre no nível terreno (aqui, agora, este mundo, prazeres momentâneos, diversões frívolas...) e todo seu pensamento circunda questões triviais ou de importância secundária. O entretenimento tem adentrado as portas dos corações humanos de ditos crentes, porque estes não têm crido e buscado ao Senhor de modo que possam ter suas mentes fixas no céu. Tais homens pensam que o Senhor lhes prometeu um mundo de alegrias, diversões e que o culto, por exemplo, deve e poder ser divertido - quando na verdade a mensagem é: "no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo" (Jo 16.33). Esta névoa de dúvidas só será removida quando verdadeiramente se olhar para o alvo que foi proposto e até ele se correr (Fp 3.14).

O professo da fé cristã que não sente o peso de seu pecado; não chora as angústias de sua mente perversa; não se ira contra suas maldades e impiedades frequentes; não lamenta profundamente o estado apático em que por vezes se encontra; não clama ao Senhor por mais fé e vivificação plena de Seu Espírito; não se levanta contra as obras das trevas e contra elas busca batalhar com a armadura da fé (Ef 6), certamente é um professo nulo, alguém cuja profissão pública serve apenas para trazer vergonha e atrair a ira do Senhor sobre sua cabeça. Tal profissão sequer entra no âmbito da anulabilidade (isto é, algo que existe, mas que é possível de ser anulado), pois nunca possuiu validade.

A ressurreição é de tal forma importante, que as Escrituras nos revelam duas ressurreições pelas quais o crente passa: "Bem-aventurado e santo aquele que tem parte na primeira ressurreição; sobre estes não tem poder a segunda morte; mas serão sacerdotes de Deus e de Cristo, e reinarão com ele mil anos" (Ap 20.6). A primeira ressurreição consiste da vivificação operada pelo Espírito Santo (Ef 2.1, 5), a ressurreição que confere vida aos pecadores mortos: "Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora, e agora é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão" (Jo 5.25). A segunda, diz respeito ao reviver do corpo mortal: "Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele" (Jo 6.54-56 - grifo meu).

É, assim, de magnífica necessidade que todos os crentes busquem compreender a maravilhosa doutrina da ressurreição, pois ela norteia, de vários modos, toda vida cristã e piedosa - ora lembrando-nos das duras penalidades que sofreremos, caso não estejamos verdadeiramente em Cristo; ora estimulando-nos para que vivamos nossas vidas na esperança do porvir.

Devido a este fato, é que Paulo complementa: "e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus". Uma vez compreendido que os crentes ressuscitarão com Cristo, porque Ele primeiramente triunfou sobre a morte (1Co 15.55), todos os Seus filhos podem estar seguros de que se assentarão no lugares celestiais, em Cristo. Neste sentido, aqui temos um eco do capítulo anterior: "Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo" (Ef 1.3).

De mortos para o pecado, a vivos para Deus. Esta maravilhosa transição é possível, somente, com Cristo Jesus. Este é um dos motivos pelos quais a Igreja do Senhor precisa pregar, ensinar e exaltar a Cristo, pois Ele é "o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim" (Jo 14.6). A esperança do cristão deve estar calcada em Cristo e em Sua obra vicária; em Sua cruz e em Seus sofrimentos; em Sua ressurreição e ascensão ao céu. Tal esperança é tão preciosa, que Paulo fez questão de recomendá-la ao amado Timóteo: "Ninguém que milita se embaraça com negócios desta vida, a fim de agradar àquele que o alistou para a guerra. E, se alguém também milita, não é coroado se não militar legitimamente. O lavrador que trabalha deve ser o primeiro a gozar dos frutos. Considera o que digo, porque o Senhor te dará entendimento em tudo. Lembra-te de que Jesus Cristo, que é da descendência de Davi, ressuscitou dentre os mortos, segundo o meu evangelho; Por isso sofro trabalhos e até prisões, como um malfeitor; mas a palavra de Deus não está presa" (2Tm 2.4-9). A força que Paulo possuía para militar na causa do Evangelho, não era devido a sua capacidade inerente, mas sim a sua fraqueza - "Porque quando estou fraco então sou forte" (2Co 12.10).  O despojar das armas da carne confere fortalecimento e dependência do Espírito.

O problema de nossos dias é que pensamos que somos fortes o suficiente para vencermos a tentação; para santificarmos nossas vidas; para evangelizarmos; para sermos bons pais e mães de família; para obedecermos aos superiores e darmos bom exemplo como filhos; para guiarmos a vida de maneira justa e, por fim, ressuscitarmos. Este é nosso problema, nosso pecado e nossa doença. Em vezes de nos considerarmos fracos, inutilmente pensamos que somos fortes.

Além disso, diz o apóstolo Paulo, um verdadeiro guerreiro em prol do Reino, não se dedica a esta vida, como se seu pagamento estivesse reduzido à semelhança dos ímpios (Sl 73), isto é, nesta terra: "Ninguém que milita se embaraça com negócios desta vida, a fim de agradar àquele que o alistou para a guerra". Cristo chamou Seus filhos para militarem segundo Suas diretrizes e ordenanças - fazer menos que isso, é fugir da guerra ou "se embaraça[r] com negócios desta vida", quando na verdade dever-se-ia "[deixar] todo o embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a carreira que nos está proposta" (Hb 12.1). O homem que uma vez foi alistado para a batalha, deve ouvir atentamente estas palavras e as guardar em seu coração: "Lembra-te de que Jesus Cristo, que é da descendência de Davi, ressuscitou dentre os mortos"

Portanto, crer na ressurreição de Cristo, é também crer na própria ressurreição no tempo oportuno, sabendo, sempre, que esta será "juntamente com ele". Porque tal fato é deveras verdadeiro "na Igreja Primitiva, os cristãos costumavam saudar uns aos outros com estas frases: 'O Senhor ressuscitou', e o outro respondia: 'É verdade; o Senhor de fato ressuscitou'." [1]

Que seja o Senhor gracioso para conosco e aumente-nos a fé a cada dia, de modo que possamos exclamar com espírito genuíno: "Graças a Deus que nos dá a vitória por nosso Senhor Jesus Cristo" (1Co 15.57).

Nota:
[1] BAYLY, Lewis (1565-1631), "A Prática da Piedade", Ed. PES, pág. 323.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Política e Escapismo



O pecado do escapismo é uma realidade, e mesmo os melhores dos santos têm sido tentados neste pecado. No Salmo 11, Davi foi tentado a fugir como um pássaro para uma montanha pois os fundamentos da sua cultura estavam sendo destruídos. De fato, naquele capítulo ele está descrevendo vários problemas que estamos experimentando atualmente na América. Mas ele resistiu à tentação de escapar, e resistiu pela fé. Ele recusou escapar das suas responsabilidades.

Uma forma de escapismo é encontrada na declaração “nossa cidadania está no céu e devemos tirar as pessoas da terra”. Mas Paulo não encontrou nenhuma contradição em reivindicar uma cidadania celestial em Filipenses 3.20 e ao mesmo tempo reivindicar e usar sua cidadania romana em Atos 16.37-39 e em 22.22-29. Nossa cidadania celestial (se corretamente entendida) impactará profundamente nossa cidadania terrena. Ela traz em perspectiva aquela frase maravilhosa, “Uma nação sob Deus”.

Outra forma de escapismo pode ser encontrada na declaração, “O reino de Deus não é deste mundo”. Novamente, essa é uma declaração verdadeira se enterdemos pela palavra “de” [deste = de + este] que o reino de Deus não é derivado deste mundo. Ele é derivado do céu. Mas o que a oração do Senhor pede? “Venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.” Essa não é uma oração escapista. É uma oração que deseja ver o reino celestial influenciar e mudar as coisas terrenas.

Outra forma de escapismo pode ser encontrada na expressão, “Estamos buscando apenas aquelas coisas que são de cima”. Uma vez mais, essa é uma declaração verdadeira, mas retirada do contexto. O contexto de Colossenses 3 é que Cristo (que é de cima) é suficiente para tudo o que precisamos na vida. Não se trata de um chamado para escapar da vida. E sabemos isso porque Paulo continua e mostra em Colossenses como Cristo é suficiente para as nossas relações no casamento, com os filhos, patrões, empregados e “tudo quanto fizerdes”. Isso não é escapismo. Isso é pedir que a Sua vontade seja feita na terra como é feita no céu. Mas era um mundo terra firma que estava sendo afetado em Colossenses.

Outra escusa dada é que o mundo não é importante. J Vernon McGee disse certa feita: “Você não dá uma polida no casco do navio que está afundando”. A ideia é que quando um navio está afundando, não se preocupe com o navio – salve almas! Ele acreditava que o nosso mundo estava afundando, sendo o evangelismo a única coisa importante com a qual deveríamos nos envolver. Mas João o Batista estava polindo casco quando tentou produzir reforma política em Lucas 3.19? Não! Ele estava fazendo o que todos os profetas do Antigo Testamento fizeram – confrontando males na sociedade e tentando fazer a diferença. Louvo a Deus por ele estar levantando candidatos que estão tentando produzir reforma em Washington, DC. E você verá sem dúvidas vários deles chegando através dessas portas. Se o mundo não fosse importante, por que o Novo Testamento diz que Deus estava em Cristo reconciliando o mundo consigo mesmo (2Co 5.19)? Por que ele prometeria que os mansos herdariam a terra (Mt 5.5)? Por que Jesus recebeu toda a autoridae no céu e na terra no primeiro século? Por que Romanos 13 diz que o magistrado civil é servo de Deus, um ministro de justiça? Por que o Novo Testamento diz tanto sobre empregadores, empregados, economia e administração da terra? Obviamente o mundo é muito importante para Deus. A Bíbliz diz, “Porque meu é todo animal da selva, e o gado sobre milhares de montanhas”, demonstrando de maneira óbvia que ele está interessado em gados e montanhas. Eu amo o hino cristão “Alegria para o Mundo”. Ele diz que a graça de Deus é destinada a avançar, indo até mesmo onde a maldição é encontrada. Isso é bem longe. A maldição tem impactado negativamente a política? Sim, tem, e a graça de Deus é suficiente para ir bem longe, mesmo onde a maldição é encontrada.

por Phillip G. Kayser

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O Evangelho de Satanás



O evangelho de Satanás não é um sistema de princípios revolucionários, nem ainda é um programa de anarquia. Ele não promove a luta e a guerra, mas objetiva a paz e a unidade. Ele não busca colocar a mãe contra sua filha, nem o pai contra seu filho, mas busca nutrir o espírito de fraternidade, por meio do qual a raça humana deve ser considerada como uma grande "irmandade". Ele não procura deprimir o homem natural, mas aperfeiçoá-lo e erguê-lo. Ele advoga a educação e a cultura e apela para "o melhor que está em nosso interior" - Ele objetiva fazer deste mundo uma habitação tão confortável e apropriada, que a ausência de Cristo não seria sentida, e Deus não seria necessário. Ele se esforça para deixar o homem tão ocupado com este mundo, que não tem tempo ou disposição para pensar no mundo que está por vir. Ele propaga os princípios do auto-sacrifício, da caridade, e da boa-vontade, e nos ensina a viver para o bem dos outros, e a sermos gentis para com todos. Ele tem um forte apelo para a mente carnal, e é popular com as massas, porque deixa de lado o fato gravíssimo de que, por natureza, o homem é uma criatura caída, apartada da vida com Deus, e morta em ofensas e pecados, e que sua única esperança reside em nascer novamente.

Contradizendo o Evangelho de Cristo, o evangelho de Satanás ensina a salvação pelas obras. Ele inculca a justificação diante de Deus em termos de méritos humanos. Sua frase sacramental é "Seja bom e faça o bem"; mas ele deixa de reconhecer que lá na carne não reside nenhuma boa coisa. Ele anuncia a salvação pelo caráter, o que inverte a ordem da Palavra de Deus - o caráter como fruto da salvação. São muitas as suas várias ramificações e organizações: Temperança, Movimentos de Restauração, Ligas Socialistas Cristãs, Sociedades de Cultura Ética, Congresso da Paz, estão todos empenhados (talvez inconscientemente) em proclamar o evangelho de Satanás - a salvação pelas obras. O cartão da seguridade social substitui Cristo; pureza social substitui regeneração individual, e, política e filosofia substituem doutrina e santidade. A melhoria do velho homem é considerada mais prática que a criação de um novo homem em Cristo Jesus; enquanto a paz universal é buscada sem que haja a intervenção e o retorno do Príncipe da Paz.

Os apóstolos de Satanás não são taberneiros e traficantes de escravas brancas, mas são em sua maioria ministros do evangelho ordenados. Milhares dos que ocupam nossos modernos púlpitos não estão mais engajados em apresentar os fundamentos da Fé Cristã, mas têm se desviado da Verdade e têm dado ouvidos às fábulas. Ao invés de magnificar a enormidade do pecado e estabelecer suas eternas conseqüências, o minimizam ao declarar que o pecado é meramente ignorância ou ausência do bem. Ao invés de alertar seus ouvintes para "escaparem da ira futura", fazem de Deus um mentiroso ao declarar que Ele é por demais amoroso e misericordioso para enviar quaisquer de Suas próprias criaturas ao tormento eterno. Ao invés de declarar que "sem derramamento de sangue não há remissão", eles meramente apresentam Cristo como o grande Exemplo e exortam seus ouvintes a "seguir os Seus passos". Deles é preciso que seja dito: "Porquanto, não conhecendo a justiça de Deus, e procurando estabelecer a sua própria justiça, não se sujeitaram à justiça de Deus" (Romanos 10:3). A mensagem deles pode soar muito plausível e seu objetivo parecer muito louvável, mas, ainda sobre eles nós lemos: - "Porque tais falsos apóstolos são obreiros fraudulentos, transfigurando-se em apóstolos de Cristo. E não é maravilha, porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus ministros se transfigurem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme as suas obras" (II Coríntios 11:13-15).

Somando-se ao fato de que hoje centenas de igrejas estão sem um líder que fielmente declare todo o conselho de Deus e apresente Seu meio de salvação, também temos que encarar o fato de que a maioria das pessoas nestas igrejas está muito distante de conseguir descobrir a verdade por si mesma. O culto doméstico, onde uma porção da Palavra de Deus era costumeiramente lida diariamente, é agora, mesmo nos lares de Cristãos professos, basicamente uma coisa do passado. A Bíblia não é exposta no púlpito e não é lida no banco da igreja. As demandas desta era agitada são tão numerosas, que multidões têm pouco tempo, e ainda menos disposição, para fazer uma preparação para o encontro com Deus. Por essa razão, a maioria, aqueles que são negligentes o bastante para não pesquisarem por si mesmos, são deixados à mercê dos homens a quem pagam para pesquisar por eles; muitos dos quais traem a verdade deles, por estudar e expor problemas sociais e econômicos ao invés dos Oráculos de Deus.

Em Provérbios 14:12 lemos: "Há um caminho que ao homem parece direito, mas o fim dele são os caminhos da morte". Este "caminho" que termina em "morte" é a Ilusão do Diabo - o evangelho de Satanás - um caminho de salvação através da realização humana. É um caminho que "parece direito", o qual, é preciso que se diga, é apresentado de um modo tão plausível que ganha a simpatia do homem natural; é pregado de forma tão habilidosa e atrativa, que se torna recomendável à inteligência dos seus ouvintes. Por incorporar a si mesmo terminologia religiosa, algumas vezes apela para a Bíblia como seu suporte (sempre que isto se ajusta aos seus propósitos), mantém diante dos homens ideais elevados, e é proclamado por pessoas que têm graduação em nossas instituições teológicas, e incontáveis multidões são atraídas e enganadas por ele.

O sucesso de um falsificador de moedas depende em grande medida de quão proximamente a falsificação lembra o artigo genuíno. A heresia não é uma total negação da verdade, mas sim, uma deturpação dela. Por isto é que uma meia verdade é sempre mais perigosa que uma completa mentira. É por isso que quando o Pai da Mentira assume o púlpito, não é seu costume claramente negar as verdades fundamentais do Cristianismo, antes ele tacitamente as reconhece, e então procede de modo a lhes dar uma interpretação errônea e uma falsa aplicação. Por exemplo, ele não seria tão tolo de orgulhosamente anunciar sua descrença em um Deus pessoal; ele dá a Sua existência como certa, e então apresenta uma falsa descrição da Sua natureza. Ele anuncia que Deus é o Pai espiritual de todos os homens, que as Escrituras claramente nos dizem que nós somos: "filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus" (Gálatas 3:26), e que "a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus" (João 1:12). E mais adiante, ele declara que Deus é por demais misericordioso para em algum momento enviar qualquer membro da raça humana no Inferno, mesmo havendo o próprio Deus dito que: "aquele que não foi achado escrito no livro da vida foi lançado no lago de fogo" (Apocalipse 20:15). Novamente, Satanás não seria tão tolo, a ponto de ignorar a figura central da história humana - o Senhor Jesus Cristo; ao contrário, seu evangelho O reconhece como sendo o melhor homem que já viveu. A atenção é então levada para os Seus feitos de compaixão e para as Suas obras de misericórdia, para a beleza de Seu caráter e a sublimidade de Seu ensino. Sua vida é elogiada, mas Sua morte vicária é ignorada, a importantíssima obra reconciliadora da cruz não é mencionada, enquanto Sua triunfante e corpórea ressurreição dos mortos é considerada como uma crendice de uma época de muita superstição. É um evangelho sem sangue, e apresenta um Cristo sem cruz, que é recebido não como Deus manifesto em carne, mas meramente como o Homem Ideal.

por A. W. Pink

terça-feira, 18 de setembro de 2012

26 Razões para Parar de ver Pornografia



As seguintes consequências são o que acontece quando um cristão vê pornografia. A lista cobre uma grande área dos resultados negativos que a pornografia tem sobre um homem que é seguidor de Jesus.

1. Alienação de Deus. Você não mais se sente próximo de Deus. Você não experimenta o poder de Deus. Você não mais tem a alegria de sua salvação.

2. Cega você para as consequências. Temporariamente te desliga da sua caminhada com Deus, de seus relacionamentos com sua esposa, seus filhos e outros. Te cega sobre o que te acontecerá espiritual, física, emocional, mental, social, vocacional e relacionalmente.

3. Cria expectativas irrealistas. Os homens começam a pensar que toda mulher deveria se parecer com aquelas e que esse tipo de relação é como seu relacionamento com sua esposa deve ser.

4. Distorce sua visão do sexo. A pornografia te faz acreditar que o sexo é somente para o prazer do homem e que as mulheres são simplesmente objetos a serem usados, ao invés de criações de Deus que devem ser honradas e respeitadas.

5. Nunca é o bastante. A pornografia tem um efeito crescente. Como uma droga, você precisa de mais e mais para satisfazer a lascívia. Ela te leva rapidamente a um caminho de destruição e para bem longe da paz, alegria, e relacionamentos saudáveis.

6. Liberdade sobre o que você pensa e faz é perdida. Você se torna escravo de seus pensamentos pecaminosos que levam a atos pecaminosos.

7. A culpa depois que você vê pornografia. Mas a culpa não é o suficiente para te prevenir de fazer na próxima vez.

8. A sexualidade saudável é obscurecida pela pornografia. Sexo saudável é somente o sexo marital, que inclui sexo regular, sexo altruísta e sexo amoroso.

9. Te isola e faz você se sentir totalmente sozinho e como o único que luta contra a pornografia e a lascívia.

10. Ameaça seu relacionamento com sua esposa ou futura esposa (se você é solteiro), seu testemunho de Jesus Cristo, e tudo em sua vida que é importante para você. Você põe tudo isso em risco pela pornografia.

11. Te mantém em um ciclo de autodestruição. A pornografia parece medicar a dor em sua vida, mas somente adiciona mais dor à dor. A pornografia te leva a fazer coisas que você nunca pensou que faria. O pecado te levará para mais longe que você gostaria. Ele te manterá mais longe que você gostaria. E te custará mais do que você gostaria de pagar.

12. Lascívia – lascívia sexual pecaminosa – te leva a atos sexuais pecaminosos. Pornografia posta em sua mente é como colocar gasolina no fogo do desejo sexual errôneo, resultando em pensamentos e ações destrutivas.

13. Mascara a verdadeira ferida.Você está procurando a cura e torna as coisas piores. 

14. Nunca é uma experiência neutra. Você não pode ver pornografia e não ser afetado por isso. Essa experiência é sempre inconsistente com a Palavra de Deus.

15. Objetifica as mulheres. A pornografia as transforma em objetos sexuais. Ela sequestra a capacidade do homem de ver uma mulher mais velha como uma figura materna, uma mulher da mesma idade como uma irmã e uma mulher mais nova como a figura de uma filha.

16. Traz um prazer muito curto, seguido por dor e mais dor.

17. Abandonar torna-se a luta de uma vida. Uma vez que você permite que a pornografia entre, há uma batalha violenta com Satanás e com sua velha natureza para se vigiar. Uma vez que você permite que a pornografia entre em sua vida, sempre haverá uma batalha. É uma batalha vencível, mas uma batalha diária.

18. Permanece em sua mente para sempre. Satanás mantém aquela imagem repetindo em sua mente para criar um ciclo de luxúria pecaminosa e te levar de volta à pornografia. Você se torna ligado a uma imagem, não a uma pessoa.

19. A vergonha entra em sua vida. Culpa é sentir-se mal por algo que você fez. A vergonha, no entanto, é baseada em sentir-se mal por quem você é. A pornografia traz vergonha. Deus nunca traz vergonha. Satanás sempre traz vergonha.

20. A confiança é perdida com as pessoas que você mais ama e respeita.

21. Abre a porta para todo pecado sexual. A pornografia é um portal, uma entrada que traz nada de bom e tudo de doloroso, como masturbação compulsiva, desejos, práticas sexuais perigosas, visita a lugares adultos, uso de prostituição, práticas sexuais pervertida e abuso sexual.

22. Viola mulheres. Como? Você está colocando seu selo de aprovação em uma indústria que degrada e desumaniza mulheres.

23. Um convite para olhar para outras mulheres.

24. Extingue a verdade. A pornografia promove a mentira. Você mente para os outros, mente para Deus e mente para si mesmo. Você mente mais para cobrir velhas mentiras. Você se torna uma mentira viva.

25. Te liga a uma imagem. Você fica preso e ligado à imagem ao invés de sua esposa ou futura esposa se você é solteiro.

26. Fecha seus lábios para o louvor a Deus, falar sobre sua fé, contar aos outros como eles podem experimentar Deus.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Efésios 2.5 - Pela Graça Sois Salvos - Exposição em Efésios - Sermão pregado dia 16.09.2012



Efésios 2.5 - Pela Graça Sois Salvos
Exposição em Efésios -
Sermão pregado dia 16.09.2012


"Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos)" (Ef 2.5).

Na sentença anterior o apóstolo Paulo deixou evidente aos irmãos de Éfeso sobre a grandiosa misericórdia que habita no Soberano e quão grandes graças Ele possui para todos os Seus filhos, de modo que todos os eleitos podem descansar às sombras das asas do Filho (Mt 23.37; Lc 13.34) e os que ainda não foram despertados para a nova natureza, podem achar da água da vida, pois "aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que salte para a vida eterna" (Jo 4.14). Tal ponto foi de muita importância nesta presente carta, pois uma vez que Paulo havia demonstrado três fatos negativos quanto à natureza do homem (1. mortos por natureza (2.1); 2. seguindo o rumo deste mundo (2.2); 3. filhos da ira (2.3)), agora o apóstolo se põem a demonstrar aos irmãos de Éfeso que de fato o Senhor é excelsamente misericordioso, de modo que nenhum pecado (exceto o cometido contra o Espírito Santo - Mt 12.32; Mc 3.29; Lc 12.10) é tão grande que não possa ser perdoado pelo Rei e eterno Salvador. 

Não é em vão que a Palavra dispõe inúmeras vezes que os cristãos foram salvos somente pela graça de Deus e isto se deu justamente no tempo em que ainda estavam mortos em suas ofensas e pecados - "Estando nós ainda mortos em nossas ofensas". Observemos com grande contrição de coração que, salvo a regeneração divina por meio do Espírito do Senhor, todos os homens carecem "da glória de Deus" (Rm 3.23). As Escrituras são enfáticas em deixar-nos registrado que enquanto estávamos mortos, fomos resgatados; quando não haviam batidas salvíficas em nosso coração, fomos transformados; quando o sangue já não corria por nossas veias, a transfusão perfeita do sangue do cordeiro a nós foi feita. Absolutamente em nenhum lugar das santas e divinas Palavras, encontramos algum dito, narrativa, poesia ou doutrina que nos informe que o Senhor apenas melhorou nossa situação diante de Sua presença santa e inabalável. Um homem que não compreende suas misérias diante do senhorio de Cristo, certamente ainda não nasceu novamente.

O Senhor, através do profeta Ezequiel, com grande propriedade registrou: "E dar-vos-ei um coração novo, e porei dentro de vós um espírito novo; e tirarei da vossa carne o coração de pedra, e vos darei um coração de carne.E porei dentro de vós o meu Espírito, e farei que andeis nos meus estatutos, e guardeis os meus juízos, e os observeis... Então vos lembrareis dos vossos maus caminhos, e dos vossos feitos, que não foram bons; e tereis nojo em vós mesmos das vossas iniqüidades e das vossas abominações" (Ez 36.26-27, 31 - grifo meu). Um homem nascido de novo, jamais olha para seus feitos pretéritos e contrários ao Senhor, e neles se alegra ou sente uma razoável vontade de retornar às práticas infernais. Um homem convertido com o santo e limpo sangue de Cristo, olha para si, percebe suas imaginações, perscruta seu coração e diz: "Tenho nojo de mim mesmo! Criatura asquerosa que sou eu! Olhe o que o pecado fez em mim! Olhe meus pensamentos, minhas atitudes e meu desviar constante do Caminho! Miserável homem que sou! (Rm 7.24)" Por este precioso ensinamento acerca do regenerar de Cristo, é que disse Davi: "Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e tudo o que há em mim bendiga o seu santo nome. Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e não te esqueças de nenhum de seus benefícios" (Sl 103.1-2). Alguém transformado pelo evangelho da graça é alguém que olha para si e sente grande repulsa, a ponto de instigar o vômito, mas que também olha para Cristo e n'Ele encontra refúgio, "verdes pastos [e] águas tranquilas" (Sl 23.2).

Eis, então, a razão para o apóstolo do Senhor registrar: "nos vivificou juntamente com Cristo". Notemos como o vivificar (dar nova vida) não é alheio a Cristo, mas sim "juntamente com Cristo". Mas, qual a importância? Ou, que diferença faz? Quer dizer, uma vez que o apóstolo havia afirmado sobre que é em Cristo que temos nossa adoção (Ef 1.5), qual a implicação desta afirmação para os cristãos?

Em primeiro lugar, é que todo aquele que está longe de Cristo, não é participante de Seu reino - "Quem não é comigo é contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha" (Mt 12.30). É preciso que os professos da fé cristã compreendam que o cristianismo é, neste sentido, uma crença de extremos: ou se está com Cristo, ou se está afastado d'Ele - e, portanto, se é filho da ira (Ef 2.3). Não é possível viver divorciado do senhorio de Deus, de Sua soberania e de Sua santidade, e ainda desejar sustentar uma filiação com Cristo. As Escrituras são explícitas: não existe meio caminho. Não se é "quase crente" ou "quase mundano" - ou em Cristo, ou nas trevas; ou no céu, ou no inferno.

Em segundo lugar, os cristãos foram reconciliados em Cristo e por Cristo - "Porque se nós, sendo inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho, muito mais, tendo sido já reconciliados, seremos salvos pela sua vida" (Rm 5.10). Não existe outra forma de reconciliação na vida cristã, exceto por meio do "Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo" (Jo 1.29). Homens mortos não abrem boca para clamar ou possuem lágrimas para chorar; eles precisam de vida, necessitam de novo fôlego. Assim como após muitos anos de brutalidade e impiedade sobre a terra, sobreveio o dilúvio, também assim vêm as águas do Senhor e salvam a alguns em Cristo e sentenciam outros à perdição e ira de Deus. Contudo, as águas de um dilúvio não somente exterminam os seres não preparados para o viver nas águas (exceto peixes e outras criaturas dotadas por Deus para serem anfíbios, bem como outros pequenos seres), mas também revigoram a terra encharcada de pecado, dando-lhe novos nutrientes, a ponto de Noé sair da arca e já ter boa terra para lavrar (Gn 9.20). Em Cristo, há reconciliação e novo viver.

Em terceiro lugar, por meio do sacrifício de Cristo, os cristãos possuem paz com Deus - "Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo" (Rm 5.1). Anteriormente, Paulo havia dito que por natureza os homens são "filhos da ira" (Ef 2.3) e por isso não possuem paz com Deus. Tais homens não podem e não devem se achegar com ousadia ao santuário do Eterno (Hb 10.19), pois à semelhança do sumo sacerdote que poderia ser punido instantaneamente com a morte, caso se achegasse impuro diante do Senhor, homens não devem fazer gracejos para com a Palavra do Senhor e acharem que idas esparsas à igreja ou vez por outra realizarem alguma "oração", lhes trará paz com Deus. Imaginar que se pode ter paz com o Soberano e Senhor dos Exércitos, sem passar por Cristo Jesus, é rejeitar o próprio Deus, pois "Quem me vê a mim vê o Pai" (Jo 14.9)

Em quarto lugar, somente se possui a grandiosa misericórdia do Deus riquíssimo dela, em Cristo: "Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno" (Hb 4.16). Todavia, como pode ser possível que alguém chegue ao trono da graça, ainda mais "com confiança" de não ser consumido, mas sim de ser bem recebido? Basta volver-nos para o versículo anterior e lermos: "Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado" (Hb 4.15). Porque Cristo "em tudo foi tentado, mas sem pecado" e venceu, e cumpriu toda a Lei, os cristãos podem se achegar ao trono do Senhor e alcançarem clemência.

Em quinto e último lugar, Cristo é o único caminho para o Pai e, consequentemente, para a salvação - "Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim" (Jo 14.6). Nem bispos, nem padres, nem sacerdotes, nem apóstolos modernos, nem "homens show", nem grupos de dança, nem crianças declamando poemas, ou qualquer coisa desta estirpe leva ao Senhor. Se a verdade vem somente por meio de Cristo, então é Cristo que precisamos ouvir - "De sorte que a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus" (Rm 10.17).

Assim é que Paulo faz o adendo e diz: "(pela graça sois salvos)". Este parêntese não deve ser entendido como um acréscimo do copista ou que não consta nos "melhores manuscritos", como comumente lemos em algumas versões bíblicas. Para sermos breves, este parêntese é de fato um parêntese escrito pelo próprio apóstolo, desejando comunicar que uma vez que os cristãos foram resgatados enquanto ainda estavam mortos e foram vivificados com Cristo, nada poderia ser mais óbvio do que afirmar que a salvação é pela graça. Porém, tristemente, se revela que nos terrenos atuais do que se chama de evangelicalismo, está muito distante de alguns a verdadeira noção do que vem a ser a graça de Deus.

Afirmar que os cristãos foram vivificados "juntamente com Cristo" e salvos "pela graça" nos leva a três aplicações:

1. A graça não é de graça

Talvez estranhemos essa declaração, pois parece contradizer tudo o que vimos até agora. Contudo, devemos recordar que para nós a graça é de graça, mas a graça que chegou até nós, não veio de graça. Isto implica em dizer que somos receptores de algo que não conquistamos, pois tal qual o Israel do Antigo Testamento habitou em "terra em que não trabalhastes, e cidades que não edificastes, e habitais nelas e comeis das vinhas e dos olivais que não plantastes" (Js 24.13), assim também os cristãos, embora tenham recebido a graça de Deus, apenas para eles é que ela veio de graça, pois para Deus, custou Seu o Unigênito.

Alguns, porventura, intentarão a muitos a fim de lhes persuadirem de que de fato a graça é de graça e, portanto, devemos tão somente agradecer ao Senhor. De fato isto é verdade, mas porque a graça é de graça para nós, não significa que devemos ignorar a grandiosa obra do Senhor em Seu Filho, afinal, fomos vivificados com Cristo. Como, então, devemos receber e aplicar esta graça? "Agora, pois, temei ao SENHOR, e servi-o com sinceridade e com verdade; e deitai fora os deuses aos quais serviram vossos pais além do rio e no Egito, e servi ao SENHOR" (Js 24.14).

É mister que os cristãos proclamem a graça, mas que não se esqueçam de proclamar que junto com esta graça, é acompanhado a renúncia. A graça nos vem de graça, mas deve nos levar à renúncia; à abdicação do "eu"; à morte diária do pecado; a mais dizer "não" para o mundo, do que sim; a guiar nossos relacionamentos sob à luz da Lei de Deus; à buscar um viver santo em completamente toda e qualquer ocasião, desde o lavar das mãos para a comida até o pregar do evangelho (1Co 10.31-32). Proclamar a graça é magnificamente importante e esta é a mensagem da salvação desde os dias subsequentes à queda de Adão e Eva, entretanto, devemos considerar que a graça que envolve o crente, custou a vida de Cristo e, portanto, "Aquele que diz que está nele, também deve andar como ele andou" (1Jo 2.6). 

Se Cristo, que é por quem somos atraídos ao Pai, viveu de maneira reta e certa diante de Deus, acaso haveríamos nós por simplesmente embargar no navio da graça e esperar sermos levados à cidade celestial, como se por aqui pudéssemos viver de maneira displicente e rejeitando o Seu sacrifício?

2. A graça leva às obras

Novamente, embora soe destoante do que comumente se vê nos arraiais evangélicos, a graça leva às boas obras em Cristo Jesus. Um homem que professa a fé no Filho de Deus, mas não vive uma vida de piedade, não chora em contrição pelos pecados cometidos, não anseia ardentemente pelo Dia do Senhor (tanto o dia propriamente dito, como o dia de Sua vinda), não proclama a Palavra da verdade - ainda que lhe custe os amigos, emprego e reputação -, não busca lutar contra o pecado e não se abstém de práticas pecaminosas - desde as maiores até as menores -, certamente está a um passo de ser tragado pelo Senhor, bastando que resvale o seu pé e chegue o dia de sua destruição (Dt 32.35).

Tiago enfatiza e nos ensina esta preciosa verdade: "Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta" (Tg 2.26). Alguém poderá replicar e afirmar que Tiago está falando de fé, enquanto o presente versículo de Paulo, fala de graça. A estes, nada responderemos no momento, pois logo no versículo oitavo do presente capítulo de Efésios se vislumbrará que a graça é o que nos leva à fé.

É importante que os cristãos compreendam que afirmar estar na graça, mas não ser impelido a realizar as obras do Espírito, é viver em uma contradição - e como vimos anteriormente, não pode haver meio termo: ou se está em Cristo e se pratica as obras do evangelho, ou se vive nas trevas e pratica-se as obras do maligno. Certamente que isto não significa que o verdadeiro cristão nunca poderá fraquejar ou viver de modo contrário à Palavra, pois se o próprio apóstolo Paulo queixava-se e lamentava profundamente o pecado que ainda permanecia em seu corpo (Rm 7.24), que diremos nós? 

O cristão é alguém ativo e que porque foi tocado pela graça, é levado a praticar as obras do Senhor e observar toda a Sua Lei - não devido a por elas ser salvo, mas sim porque, assim como um filho agradece ao pai terreno por um presente que recebeu e depois procura ser um bom filho em obediência e bons feitos, de igual maneira o cristão é levado a buscar viver de modo que glorifique ao Senhor em tudo o que faz (1Co 10.31), mesmo sabendo que constantemente vacilará - mas, como é crente na graça de Deus, não desfalecerá pela caminho, "Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade" (Fp 2.13)

3. A graça não elimina os efeitos do pecado aqui na terra

É um erro grosseiro o cristão ser levado a pensar (e até mesmo proclamar) que porque foi perdoado, não deve sofrer as consequência do pecado e de seus pecados enquanto vive. Se fosse verdade que a graça elimina toda e qualquer mazela proveniente do pecado, o ladrão da cruz teria de ser liberto, pois foi salvo por Cristo e teve seus pecados perdoados (Lc 23.43); Davi não deveria ter sido castigado com a morte de seu filho advindo do adultério, pois posteriormente orou e pediu a Deus que lhe perdoasse (2Sm 2.13-14; Sl 51); o povo de Israel também foi castigado, então, várias vezes de modo injusto, pois o Senhor os perdoava constantemente.

A verdade é que no lugar do evangelho da graça, se tem visto muitas vezes a proclamação do evangelho da desgraça. Sim, não ouso titubear ante esta apostasia generalizada que vemos em muitas ditas igrejas de "Jesus" e movimentos malignos. Pela misericórdia do Eterno sempre tem havido o remanescente fiel e que não tem se dobrado diante dos ídolos levantados por homens (1Rs 19.18), como sucesso, dinheiro, riquezas, fama, prestígio, curas, milagres, livre arbítrio e toda sorte de patifaria que se tem visto. Todavia, tristes fatos havemos de recordar, pois não são poucos que elevam suas vozes de falsos profetas e proclamam uma graça que mais traz desgraça (a falta da genuína graça de Deus), do que a verdadeira graça salvadora.

Que possa o Senhor abundar-nos de graça, mas sempre nos levando em Sua viva palavra, a fim que não nos esqueçamos de Ele, "pois, compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer" (Rm 9.18), de modo que não brinquemos por esta terra, e sim vivamos conforme nosso chamado para a batalha pelo Reino de Deus.

sábado, 15 de setembro de 2012

Podemos Fazer Imagens de Cristo? John Murray



A  questão da conveniência das representações gráficas do Salvador é uma  tal que merece ser analisada. Há de se assentir que a adoração a Cristo é  central em nossa santa fé, e que o pensar a respeito do Salvador deve,  em qualquer instância, ser acompanhado com a reverência que pertence a  Seu culto. Nós não podemos pensar nEle sem a apreensão da majestade que  Lhe é própria. Se não recebemos em nós o especial senso de sua  majestade, então somos culpados de impiedade e de desonrá-lo.

Deve  ser reconhecido que o único propósito que com propriedade poderia ser  alcançado por uma representação pictórica é o de que ela transmitiria a  nós algum pensamento ou lição que representasse à Cristo, em consonância  com a verdade e capaz de promover adoração. Daí, a pergunta é  inevitável: é uma representação pictórica uma forma legítima de  transmitir a verdade a respeito dEle e de contribuir com a adoração que  esta verdade deve evocar?

Estamos  todos conscientes da influência exercida sobre a mente e o coração  pelas imagens. As imagens são poderosos meios de comunicação. Como elas  são sugestivas para o bem ou para o mal, e tanto o mais quando  acompanhadas do comentário da palavra escrita ou falada! É inútil,  portanto, negar a influência exercida sobre a mente e o coração por uma  imagem de Cristo. E, se tal é legítimo, a influência exercida deveria  ser uma tal que constrangesse ao culto e à adoração. Reclamar qualquer  objetivo menor que este, como se servido por uma imagem do Salvador,  seria contradição ao lugar que Ele deve ocupar no pensamento, afeição e  honra.

O  argumento para a conveniência das imagens de Cristo se baseia no fato  de que Ele era verdadeiramente homem, que tinha um corpo humano, que era  visível em Sua natureza humana para os sentidos físicos, e que uma  imagem nos ajuda a absorver a estupenda realidade da Sua encarnação, em  uma palavra, que Ele foi feito à semelhança dos homens e foi encontrado  em forma de homem.

Nosso  Senhor tinha um corpo verdadeiro. Ele poderia ter sido fotografado. Um  retrato poderia ter sido feito dEle e, se fosse um bom retrato, teria  reproduzido sua imagem.

Sem  dúvida, os discípulos, nos dias de Sua carne, possuíam uma vívida  imagem mental da aparência de Jesus e não poderiam deixar de ter retido  esta recordação até o fim de seus dias. Eles nunca poderiam reter o  pensamento nEle, pensar em  como Ele peregrinou ao seu lado, sem algo daquela imagem mental e não  poderiam tê-la a parte da adoração e do culto. As características em si,  características das quais se lembravam, seriam parte integrante da  concepção que tinham dEle, e das remiscências do que Jesus fora para  eles em sua humilhação e na glória da aparência da sua ressurreição. E  muito mais poderia ser dito a respeito da importância das  características físicas de Jesus para os discípulos.

Ademais,  Jesus também é glorificado no corpo e esse corpo é visível. E também se  tornará visível para nós, na sua vinda gloriosa "aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para salvação." (Hebreus 9:28).

O  que, então, podemos dizer sobre as imagens de Cristo? Primeiro de tudo,  é preciso dizer que não temos qualquer tipo de dados como base para  fazer uma representação pictórica; não temos descrições de suas  características físicas para que ao menos permitissem ao mais  aperfeiçoado dos artistas fazer um retrato aproximado. Tendo em conta a  profunda influência exercida por uma imagem, especialmente nas mentes  dos jovens, devemos perceber o perigo envolvido em um retrato para o  qual não há nenhuma garantia, um retrato que é criação da pura  imaginação. Tal pode auxiliar a assinalar a tolice de perguntar: qual  seria a reação de um discípulo, que realmente vira ao Senhor nos dias da  sua carne, ante um retrato que seria  obra da imaginação de alguém que  nunca viu o Salvador? Assim facilmente podemos detectar qual seria a sua  repulsa.

Nenhuma  impressão que temos de Jesus deve ser criada sem a adequada informação  revelatória, e cada impressão, cada pensamento, deve evocar o culto.  Assim, uma vez que não possuímos dados reveladores para uma imagem ou  retrato no sentido próprio do termo, estamos impedidos de fazer uma ou  de usar qualquer uma que tenha sido feita.

Em  segundo lugar, as imagens de Cristo são, em princípio, uma violação do  segundo mandamento. Uma imagem de Cristo, se serve a algum propósito  útil, deve evocar algum pensamento ou sentimento a respeito dEle e,  tendo em vista o que Ele é, este pensamento ou sentimento será de  adoração. Não podemos evitar de fazer da imagem um meio de adoração.  Mas, uma vez que os materiais para esse meio de culto não são derivados  da única revelação que possuímos a respeito de Jesus, ou seja, das  Escrituras, o culto por meio de imagens é limitado a uma criação da  mente humana que não tem garantia revelatória. É uma adoração baseada na  vontade humana apenas. O princípio ensinado pelo segundo mandamento é  que devemos adorar a Deus somente nas formas prescritas e autorizadas  por Ele. É um grave pecado cultuar compelido por uma invenção humana, e é  isso que uma imagem do Salvador envolve.

Em  terceiro lugar, o segundo mandamento proíbe curvar-se a uma imagem ou  semelhança de qualquer coisa em cima no céu, ou embaixo na terra, ou que  está na água debaixo da terra. A imagem do Salvador pretende ser uma  representação ou semelhança dEle que está agora no céu ou, pelo menos,  de quando Ele peregrinou na terra. É claramente proibido, portanto,  prostrar-se diante de tal representação ou semelhança. Isso expõe a  iniquidade envolvida na prática de expor representações pictóricas do  Salvador em locais de culto. Quando adoramos ante uma imagem de Nosso  Senhor, quer seja sob a forma de um mural, ou em tela, ou em vitrais,  estamos fazendo o que o segundo mandamento proíbe expressamente. O que  se torna ainda mais evidente se tivermos em mente que a única razão pela  qual uma imagem deveria ser exibida em um lugar é a suposição de que  ela contribuiria para a adoração daquele que é o nosso Senhor. Esta  prática só demonstra como é fácil tornar-se insensível aos mandamentos  de Deus e às incursões da idolatria. Que a Igreja de Cristo esteja  desperta para os expedientes enganosos pelos quais o arqui-inimigo  sempre tenta corromper a adoração do Salvador.

Em  resumo, o que está em jogo nessa questão é o único lugar que Jesus  Cristo como o Deus-homem ocupa em nossa fé e  no culto que prestamos; e o  lugar único que a Escritura ocupa como a única revelação, o único meio  de comunicação, a respeito daquele a quem adoramos como Senhor e  Salvador. A Palavra encarnada e a Palavra escrita são correlativos. Não  ousemos usar outros meios de impressão ou de sentimento, mas os da Sua  instituição e prescrição somente. Cada pensamento e impressão dEle deve  evocar adoração. Nós O adoramos com o Pai e o Espírito Santo, um só  Deus. Usar uma imagem de Cristo como um auxílio para o culto é proibido  pelo segundo mandamento, tanto quanto isto é proibido em relação ao Pai e  ao Espírito.

texto por John Murray
Republicado a partir de Reformed Herald, Fevereiro 1961

O culto online e a tentação do Diabo

Você conhece o plano de fundo deste texto olhando no retrovisor da história recente: pandemia, COVID-19... todos em casa e você se dá conta ...